Formação Continuada fortalece atuação dos coordenadores pedagógicos

Se há um consenso entre os estudiosos da educação é em relação à importância da figura do coordenador pedagógico em uma rede de ensino. O profissional, corresponsável pela gestão pedagógica de uma instituição escolar, tem contribuição direta na qualidade do ensino, projetos, base curricular, além da manutenção da harmonia nas relações interpessoais que envolvem os públicos da escola. Neste conjunto de atribuições, está a formação docente. A partir da observação e correlação profunda entre bases didáticas e proposta curricular, vinculada estreitamente à realidade expressa na instituição de ensino, o profissional consegue traduzir em ações as necessidades de aprendizagem para o contexto em que a escola está inserida.
 

Em 2018, a Secretaria da Educação do Estado da Bahia, no último concurso para a rede de ensino, abriu novas vagas de coordenador para as aproximadamente 90% das escolas estaduais que não contavam com esse profissional. Um passo importante que reconhece a função específica do coordenador e traz incontáveis benefícios para o processo de ensino-aprendizagem.

Imagens 2019

Estes profissionais iniciaram sua jornada nesta função desafiadora no ano de 2019, mesmo ano em que a atual diretora geral do Instituto Anísio Teixeira, Cybele Amado de Oliveira, entrou na rede trazendo inovações. Para o órgão, que faz parte da Secretaria da Educação do Estado, a gestora trouxe a formação continuada de dupla gestora (coordenador pedagógico e diretor escolar)  em contexto de serviço. Já tendo atuado como coordenadora e tendo vivido as dificuldades que o coordenador recém-chegado vive, ela ressalta a necessidade de se aprender “o lugar, o papel, a função, a rotina e a prática” do coordenador. 

A formação continuada é, então, ao ver de Cybele,  que já atuou também como professora e diretora escolar, imprescindível para que este profissional consiga exercer sua função. Função esta que envolve a formação docente, mas que vai além. 
“É lançar mão de outro prisma para enxergar o invisível, promover projetos interdisciplinares, construir processos de avaliação, entender seus resultados e, mais importante, ensinar como se ensina”. Não do papel de um especialista, mas de alguém que tem condições de tematizar e refletir sobre a prática do professor, avaliando junto e fazendo pontes entre os possíveis “pares” no contexto da escola.
 
Das suas memórias mais significativas, na casa de alunos da escola, com pais analfabetos, encontrou o “canto das letras”, espaço simples com esteira, almofadas de garrafa pet e alguns livros, mostrando que ali, a pedido da então coordenadora, estava marcado “o tempo e o espaço do estudo” para aquelas crianças. Com essa lembrança, mostra outro papel importante do coordenador, que é a aproximação entre família e escola, sempre com foco no coletivo, mas com um olhar especial para a individualidade de cada estudante.
 
A implantação do plano de formação teve relação muito íntima com a entrada dos novos coordenadores, profissionais que ainda estavam definindo, junto à suas redes de ensino, o seu papel e sua rotina de trabalho. Há um ano e sete meses na rede estadual, a coordenadora Sizeania Pacheco Medeiros, do Colégio Estadual da Lagoa do Dionísio, em Ibitiara, conta que sua chegada gerou grande expectativa na escola, haja visto que era uma das instituições que não contava com a figura do coordenador. “A minha chegada gerou muitas expectativas ao corpo docente, que sentia a necessidade de um trabalho mais articulado e orientador”. 
 
Sizeania conta que a formação continuada está contribuindo para suas atividades de planejamento com os professores. "Traz muitas possibilidades de melhoria do processo didático-metodológico. A formação tem  proporcionado momentos muito significativos.  Nos presenteou com trabalhos pautados em sequências didáticas, leituras colaborativas… Além disso,  a convivência e partilha de conhecimentos com outros coordenadores é muito importante". 
 

Expectativa X Realidade

 
A educadora Roselle Santos, 35, também foi a primeira coordenadora pedagógica da escola onde trabalha, o Colégio Estadual Doutor José Antonio de Araújo Pimenta, em Cardeal da Silva. Pedagoga e bacharel em direito, Roselle sempre teve o sonho de se tornar coordenadora. Não para ser aquela figura que diz "faça assim", "faça assado", mas para trabalhar ao lado dos professores. "Eu queria ter um escudo para colocar na frente deles", conta. 
 
Mas quando chegou à escola, parecia estar vivendo aquele meme da internet que mostra o que é expectativa e o que é realidade. "A teoria é muito diferente da prática. A figura do coordenador pedagógico era nova na escola e eu cheguei sem experiência… Os professores veteranos tiveram muita resistência. Eu podia ouvir eles pensando: quem é essa menina?"
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Aos pouquinhos, Roselle foi mostrando a que veio e ganhando a confiança dos professores, estudantes e da comunidade. Para ela, a formação continuada foi fundamental nesse processo. "É muito importante para pensar nossas práticas e como chegar nos professores. Aprimora as nossas ideias e nos amadurece". 
 
O que ouviu nos encontros formativos do NTE 18 (Litoral Norte e Agreste Baiano, com sede em Alagoinhas) a ajudaram a começar a mudar o que "tinha que mudar" na escola. A "maior vitória de todas" levou um ano para ser construída. As Atividades Complementares (ACs), que integram o planejamento e organização das atividades com os professores, passaram a acontecer com regularidade e horário reservado. Ou melhor, "certinhas",  como Roselle orgulha-se de dizer. 
 
Ela também aproveita as reuniões de formação para conhecer e trocar experiências com outros coordenadores pedagógicos, mais experientes ou recém-chegados à rede estadual como ela. "Às vezes aparece um problema e você não encontrou uma solução ainda, mas talvez o colega já tenha encontrado. A gente aprende, absorve ideias e vai ajustando à nossa realidade".
 

Foco na aprendizagem 

 
Quando cursou pedagogia em Juazeiro, a quase 500 km de onde Roselle trabalha, Camila Silva, 26, lembra de ter tido uma única atividade voltada a pensar o papel do coordenador pedagógico. A tarefa era entrevistar um desses profissionais e ela escolheu a coordenadora da escola onde cursou o ensino médio. "Você estudou aqui, não foi?", ela perguntou, e Camila ficou tocada com a lembrança. Mas isso foi tudo, em quatro anos de graduação. 
 
Depois da formatura, ela se tornou professora do Ensino Fundamental I e começou a reparar melhor nas práticas do coordenador da escola onde dava aulas. "Eu vi que aquele profissional era como uma mola-mestra", conta. Foi acalentando o desejo de também ocupar esse papel, quando a oportunidade surgisse. 
 
Veio o concurso e Camila se tornou coordenadora do Colégio Jutahy Magalhães, com mais de mil estudantes matriculados. Se ela se assustou? "Muito!" ri.
"Eu cheguei na escola com 25 anos e muitos professores de lá tinham mais de 25 anos de profissão". 
Ela começou a construir uma relação de confiança com todos, professores e estudantes, com um argumento que virou mantra: o foco é a aprendizagem. 
 
Um dos projetos que ela criou com professores da escola, o Clube do Livro Nim, que leva esse nome em homenagem à árvore indiana comum na cidade, foi parar no encontro de formação com coordenadores pedagógicos e diretores escolares do NTE 10 (Sertão do São Francisco, com sede em Juazeiro). Para ela, as reuniões são momentos "riquíssimos" de compartilhamento". "A gente conhece a realidade de outras escolas e troca experiências que deram certo. A formação é esse processo de ação, reflexão, ação. Dá um suporte técnico para que a gente possa trabalhar da melhor forma. Me sinto mais amparada. Até a postura muda diante das problemáticas. Tem um olhar para a resolução".  
 

Dupla gestora de verdade

 
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A formação continuada alicerça o caminho de quem se tornou coordenador pedagógico há pouco tempo, mas também muda o olhar e as práticas de quem já trilha esse percurso há muitos anos. Ou melhor, décadas. A psicopedagoga Josete Menezes é coordenadora pedagógica do Colégio Estadual Duque de Caxias, em Entre Rios, há 23 anos. Por um longo período, só havia duas coordenadoras pedagógicas em todo o NTE 18, que reúne 20 cidades do Litoral Norte e Agreste Baiano. "Quando cheguei na escola, parecia que eu era um ser de outro planeta. Ninguém sabia o que eu tinha ido fazer ali". 
 
Hoje, todo mundo já conhece Josete na escola e o seu trabalho de mudar o entendimento sobre aprendizagens e avaliações. "Fui aos poucos mostrando que aprendizagem não é só o professor ir para a sala e passar o assunto". Ela também incentivou a criação de projetos multidisciplinares e a aproximação com os estudantes. A iniciativa mais recente é o projeto Cuida Bem de Mim, que promove o acolhimento emocional e afetivo dos alunos da escola, a partir de escutas com psicólogos parceiros do projeto. Cada turma também tem o Anjo do Bem, responsável por ouvir e acolher os colegas de sala. 
 
O projeto deu tão certo que já foi implantado em duas outras escolas e deverá se espalhar por todas as instituições de ensino do município, públicas e privadas, assim que as aulas presenciais retornarem, pós-pandemia. 
 
Tudo isso Josete já fazia, mas com a formação continuada está conseguindo atuar, de fato, como dupla gestora, em parceria com a direção da escola. "Eu trabalhava muito isolada, para dizer a verdade… Não existia uma articulação entre o administrativo e o pedagógico. Eu falava com a direção: 'Ah, pensei em tal projeto' e fazia. Não tinha uma discussão do que e como seria feito. Hoje, não. A gente senta toda semana, segunda-feira, na hora do almoço, para refletir sobre nossas práticas, avaliar o trabalho. Também passei a ficar mais atenta às verbas da escola. Antes era um negócio que eu ficava alheia. Hoje já sugiro pra onde o recurso poderia ir. É uma parceria, realmente, voltada para o âmago do nosso trabalho, que é a aprendizagem".

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